Os interesses da burguesia e a guerra
O drama das eleições continua. Terminou o primeiro turno com resultados decepcionantes. Para nossa triste realidade ficou demonstrado que há uma grande parcela do povo brasileiro extremamente reacionária e conservadora. Fanáticos como Damaris Alves e Ricardo Salles, militares como o general Mourão e lava jatistas como Sérgio Moro e Deltan Dallagnol elegeram-se por grande maioria de votos. O governo já fez uma numerosa bancada na Câmara e no senado e o seu partido, o PL, passou a ser o maior partido do país. Caminhamos agora para o segundo turno e a campanha política já recomeçou com toda sua mediocridade e apelando para os sentimentos mais grotescos. Parece que os partidos não se deram conta de que o que está em jogo é a opção entre civilização e barbárie.
Diante deste quadro político muito tenso, torna-se difícil falar de economia, mas, vamos cumprir nossa obrigação, pois há acontecimentos importantes a comentar.
Temos falado continuamente na aproximação de uma nova crise. Mesmo sem os acidentes do covid-19 e da guerra Rússia Ucrânia, a economia mundial estava entrando em um novo ciclo de crise. Previmos isto em nossas Análises. Os dois acontecimentos não econômicos e casuais, (covid e guerra) aceleraram a deflagração do fenômeno da crise. Com o caso covid em fase de superação, com exceção da China onde o vírus causa grandes perturbações, o problema que se arrasta é o da guerra. Tudo indica que ainda teremos de conviver com ela por algum tempo. O curioso é que as organizações internacionais, embora destaquem os efeitos que ela vem produzindo, procuram minimizar a verdadeira causa. Mas, a dura realidade vem obrigando ao reconhecimento dos fatos.As empresas de transportes marítimos atestam o cancelamento de muitos fretes contratados e rotas de navegação. No Pacífico o preço dos fretes caiu 75% e são canceladas várias rotas na Ásia e na Europa. Em outubro, na primeira semana, foram canceladas 1/3 da capacidade dos contêineres e na segunda semana, a metade desta capacidade o que mostra que o comércio mundial está em desaceleração, forte indicador de crise.
A Agência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad) reconhece que está em marcha uma “recessão global induzida”deflagrada pelo aumento das taxas de juros dos países desenvolvidos o que provocará uma “crise em cascata de dívida, saúde e clima”. No Relatório Anual de Comércio e Desenvolvimento a Unctad afirma que a “política fiscal das economias avançadas” está criando o “risco de empurrar o mundo para uma recessão global e estagnação prolongada”. A Unctad alerta que esta crise terá consequências piores que a crise de 2008 e a crise da covid em 2020. Em 2022 o crescimento mundial não ultrapassará os 2,5% com uma perda global de US$17 trilhões para o PIB mundial,mas omite a responsabilidade da guerra neste quadro.
A Organização Mundial do Comércio (OMC) cortou suas projeções para o comércio mundial. Neste ano as trocas crescerão apenas 3,5% e no próximo não ultrapassa 1%. A OMC estima o crescimento do PIB mundial em 2,8%, em 2022 e em 2,3% em 2023. Segundo ela, esta situação é causada pela guerra, pela inflação, pela elevação dos preços dos alimentos e combustíveis, e pela alta dos juros. Por seu lado o Fundo Monetário Internacional, através de sua diretora geral Kristalina Georgieva, alertou para o aumento dos riscos de uma recessão. O Banco Mundial (BM) elevou suas estimativas de crescimento da América Latina e Caribe de 2,3% para 3%, neste ano, mas baixou de 2,2% para 1,6% os números para 2023. O BM aponta como causas a elevação dos juros, a desaceleração mundial, os preços dos combustíveis e alimentos e a redução dos investimentos públicos, mas omite também a guerra. Sobre o Brasil, o BM destaca o crescimento da pobreza afirmando que, em 2020, 1 em cada 5 brasileiros vivia abaixo da linha da miséria e que em 158 países estudados o Brasil ocupa a 14ª posição entre os de pior nível de desigualdade.
Há ainda outra notícia internacional preocupante. Para a fúria dos EUA, a Opep, cartel dos países produtores de petróleo, decidiu reduzir a produção em 2 milhões de barris dia como forma de evitar a queda dos preços diante da redução da demanda provocada pela desaceleração. Os americanos acusaram a Arábia Saudita, líder do grupo, e aliada deles, de agorase aliar aos russos. Biden quer rever as sanções ao petróleo da Venezuela e anda conversando com o Maduro, além de lançar no mercado parte de suas reservas estratégicas.Mudam os interesses, mudam as amizades, mas a crise inexoravelmente vem aí.
Esta situação caótica que se agrava coloca uma grande questão a ser respondida. Qual o mistério que se esconde por traz destes acontecimentos e que estão levando a burguesia internacional a apostar tão alto na guerra? Desorganizam-se as cadeias de valor e as rotas de circulação de mercadorias, prejudica-se a globalização, desintegram-se os mercados, prejudica-se a lucratividade dos negócios, caem os lucros, perturba-se todo o modo de vida do planeta e leva-se a humanidade à beira do holocausto nuclear.A inquietação social leva a revoltas e greves que tendem a ocorrer por toda parte. Será que a destruição da Rússia justifica um preço tão alto?
O que a burguesia internacional pretende ganhar com isto?Por que a histeria belicista dos militares da OTAN e os interesses da indústria bélica conseguiram cegar a culta Europa a ponto de arrastá-la para esta catástrofe?
É neste ambiente de grande instabilidade que teremos de optar: civilização ou barbárie?
Foto: Gabinete do Presidente da Ucrânia -Explosão em Kiev no dia 24/2/22.