Querido Galvão, meu guru
Você partiu. Nos deixou prematuramente. Você era mais do que um irmão para mim. Durante 58 anos, foi meu melhor amigo. Sua inteligência, seu amor pelos livros, sua cultura enciclopédica, sua solidariedade e seu companheirismo faziam parte da sua existência e influenciaram decisivamente a minha.
Desde adolescente, você demonstrou ter uma mente poderosa. Não havia tema que não falasse ou escrevesse com competência. Em seus artigos, falava com desenvoltura sobre música, literatura, filosofia, história e política. Eu lia seus textos e ficava embevecido.
Sempre que podia, ia lhe visitar nas redações dos jornais. Ver como você conseguia produzir escritos primorosos naqueles ambientes barulhentos. E sempre conseguia! Um gênio no oficio. Sua vida foi uma inspiração constante para mim.
Mesmo antes de entrar na universidade, me apaixonei pela América Latina ao ler dois livros que você me emprestou da sua fascinante biblioteca: Canto Geral (Pablo Neruda), e O Dilema da América Latina (Darcy Ribeiro). A partir daí você tornou-se meu guru. E era assim que passei a chama-lo na intimidade: meu guru!
Você me ensinou tudo do pouco que sei. Sobre a vida, sobre o amor, sobre a tolerância, sobre a solidariedade com o próximo, sobre a diferença entre ser radical e ser sectário, na vida e na política.
Você era uma radical da liberdade. Ia sempre à raiz do problema. Em todos os momentos, lutou para que as pessoas fossem livres da exploração social, das amarras do preconceito, das limitações da ignorância, do autoritarismo que nos ameaça, dos meus medos.
Em seu último telefonema, mesmo com a voz debilitada pela doença, você manteve o bom humor, a ironia fina, o pensamento lúcido e a crítica ao governo genocida que nos atormenta. Confortou-me mais do que eu a você. Em seu corpo fragilizado, tinha mais força do que eu.
Você se foi apenas fisicamente. Infelizmente não conversaremos mais. Mas, com sua energia, sua força, sua bondade e seu exemplo, sempre estará comigo. No meu coração, na minha mente, na minha vida.
Beijos, meu guru!