A marcha do golpe
Quem pensa que o presidente Jair Bolsonaro (PL) desistiu de um golpe de Estado para permanecer no poder está redondamente enganado. O evento oficial promovido no Palácio do Planalto em desagravo ao deputado federal Daniel Silveira (PTB), condenado pelo STF por sistemáticos ataques à democracia, é mais um passo para desacreditar o sistema eleitoral brasileiro, a justiça eleitoral e preparar sua tropa para o dia seguinte à sua provável derrota nas urnas, em 2 de outubro.
Em todas as pesquisas eleitorais realizadas até agora, Bolsonaro perde para Lula (PT), seu principal oponente, e outros opositores. Sua situação política é periclitante. Ele sabe que, uma vez fora do Palácio do Planalto a partir de 1º de janeiro de 2023, ele e seus filhos correm sério risco de serem presos, em consequência dos ataques contra às instituições democráticas e difusão de fake news, além de outros crimes.
No momento em que o Brasil vive uma escalada inflacionária, registrando 11,30% no acumulado de 12 meses, maior índice em 27 anos, a rejeição a Bolsonaro inviabiliza seu crescimento eleitoral. Mesmo com o aumento para 400 reais no Auxílio Brasil (antigo Bolsa família), a carestia tem corroído o salário dos trabalhadores mais pobres e despencado a já baixa popularidade do presidente.
Para tirar o foco das profunda crise econômica que assola a economia brasileira, além da corrupção ocorrida no Ministério da Educação, Bolsonaro volta suas baterias contra o STF (Supremo Tribunal Federal) e o sistema eleitoral brasileiro. Seu grito de guerra serve para criar uma cortina de fumaça na inoperância do governo federal e açular a ira da sua milícia digital.
Ao retomar a ofensiva, Bolsonaro tenta estabelecer um clima de desconfiança com relação às urnas eletrônicas, as mesmas que o sagraram presidente em 2018. Sua estratégia é clara e constrói uma narrativa relativamente eficaz e mobilizadora para seus seguidores. Uma vez perdendo o pleito em outubro, afirmará que o processo foi fraudado e que, por isso, merece continuar no poder. Donald Trump tentou essa jogada, mas não encontrou respaldo político e militar necessário.
Para que a estratégia de Bolsonaro tenha o efeito almejado é preciso que ele obtenha, em primeiro lugar, uma grande votação. Em segundo, que seu partido e demais siglas apoiadoras elejam um grande número de deputados e senadores para o Congresso Nacional. E por último, e não menos importante, que as Forças Armadas encampem uma aventura golpista para dar continuidade ao mais desastroso governo que o Brasil já teve, em todas as áreas sociais.
Não tenhamos ilusão. O Brasil não é os Estados Unidos. Nossa democracia é frágil e, no século passado, já sofreu muitos golpes. No parlamento brasileiro há muitos políticos que desejam um regime autoritário para reprimirem os movimentos sociais e agirem nas sombras. Além disso, existem muitos generais que sonham em retornar ao poder, saudosos da ditadura.
Entre 2 de outubro de 2022 e 1º de janeiro de 2023 haverá um longo e tenebroso 3º turno. Caso perca nas urnas, dificilmente Bolsonaro reconhecerá a derrota. Tudo será feito, por ele e seu grupo palaciano, para permanecer na presidência e livre dos processos judiciais.