A caminho do despenhadeiro

Quando esta Análise for publicada provavelmente as eleições estarão ocorrendo. É consenso que serão as eleições mais polarizadas e tensas dos últimos anos. O que está em jogo é a própria democracia. Todos os dias as ameaças de golpe são proferidas pela autoridade máxima que deveria zelar pela ordem democrática. Por mais louco que possa parecer, a palavra de ordem de luta armada para a tomada do poder passou a ser da direita curiosamente já sentada no trono.  “O povo armado jamais será escravizado” é o lema do governo. E o governo não tem armas suficientes? E as forças armadas, polícia, exército, marinha etc., estão desarmados? Ou não merecem confiança? Quem quer escravizar o povo? Nenhuma resposta é dada a estas perguntas. Isto só pode significar que o atual sistema político de dominação não é suficiente para garantir o poder da burguesia mais reacionária que está entrando em pânico e não confia nem em seu aparato militar já existente. É preciso mudar as regras do jogo pois estas regras não permitem certas arbitrariedades. Aliás, as mudanças das regras já estão sendo feitas no dia a dia. O presidente usa o estado como se fosse sua propriedade particular. Instalações, dinheiro, aviões, veículos, tudo é usado como propriedade privada, diante da passividade dos órgãos e poderes fiscalizadores e controladores. Com o orçamento secreto o governo comprou o “centrão” e consegue aprovar o que bem entende com a ajuda dos presidentes da câmara e do senado. Restou um único poder, o STF que ainda tenta conter os desatinos ilegais.

Mais uma vez a sociedade civil vai se tornando conivente como o golpe em marcha, colaborando com ele e protegendo o candidato autoproclamado ditador. As forças armadas, fiéis a sua tradição de “capitães do mato”, fazem, por enquanto, a retaguarda garantindo com os seus fuzis e canhões as arbitrariedades, corrompida que foi pelos altos cargos conquistados no interior do governo, com bons salários e alimentada pelo seu anticomunismo primário e ultrapassado. 

É neste clima que caminhamos para as eleições sem qualquer garantia que elas serão realizadas ou que seu resultado será respeitado. A campanha política está aí, mais grotesca do que de costume, onde a maioria dos candidatos mostra suas caras desavergonhadas prometendo a defesa das mulheres, dos pretos, dos LGBT, da educação, da saúde, da moradia. Todos prometem mais emprego melhores salários, mais saúde, ambulâncias, escolas etc. Ninguém pergunta o que andaram fazendo no passado. Alguns são particularmente cínicos e, embora bolsoninions, escondem seu comprometimento com o atual governo. Os eleitores, por outro lado, ignorantes e desinformados votam pela cara, pelas relações pessoais e possíveis favores recebidos ou a receber. Não sabem que, no atual sistema, votando assim, em vez de eleger um amigo poderão estar elegendo seu pior inimigo. A escolha deveria ser antes de tudo pelo partido e não pelas pessoas. Cada partido ou grupamento de partidos coligados receberá um pacote de votos e, dependendo do coeficiente eleitoral, elegerá um certo número de candidatos que serão os mais votados da legenda. Desse modo, seu voto poderá eleger seu maior inimigo. Nenhum voto deveria ser dado a qualquer candidato que pertença a um partido da base do governo. Todos são inimigos incluindo aí todos os partidos do chamado centrão. Nada conseguiremos se não mudarmos a composição do parlamento. Fora com as bancadas da bala, do boi e da bíblia.

Vejam os leitores como está difícil falar de conjuntura econômica em tal situação. A democracia está à beira do abismo com a conivência de parte da sociedade civil, dos partidos e dos militares. O povo que o Bolsonaro quer armar é para manter os outros escravizados. As violências estão ocorrendo e devem se intensificar com a proximidade da votação. Tentam criar instabilidade e medo e é para isso que querem armar “o povo”. Torna-se necessário denunciar e resistir. Obrigar os órgãos especializados, e já institucionalmente armados par este fim, a enfrentar a violência e colocar o tal “povo armado” do Bolsonaro no seu devido lugar. 

Mas, não satisfeito com as proezas nacionais, o presidente fez questão de nos envergonhar perante as nações do mundo. Não perdeu oportunidades e, no enterro da rainha e na reunião da ONU, aproveitou os discursos para dar demonstração de grosseria e mediocridade e fazer campanha política para seus fanáticos. Mais uma vez servimos de pasto para a crítica mundial e estamos pagando mais um mico pelo mito. Que vergonha!

Na economia temos de comemorar a elevação dos juros pelo mundo todo. Acabaram os tempos de juros negativos. O Fed, Banco Central (BC) dos EUA elevou seus juros para o intervalo entre 3% e 3,5%. O Banco da Suíça subiu de -0,25% para 0,5%. Os BCs da Suécia, Dinamarca e Canadá também elevaram os juros. A onda de elevação de juros é tal que o Banco Mundial alertou para o risco de se conduzir a economia mundial “a uma recessão devastadora” que já está em marcha embora procurem esconder ou disfarçar. A produção de aço no mundo, em agosto, já desacelerou -3%, na Turquia -11,3% e no Japão, EUA e Rússia -5,5%.

Para nossa maior desgraça, a Comissão Europeia aprovou nova decisão proibindo a importação de produtos oriundos de zona de desmatamento: madeira, couros, carnes, chocolate, borracha, café, soja, carvão, milho, óleo de palma e produtos deles derivados. Isto agrava a situação de nosso agro que já não anda bem. O IPEA estimou que o PIB agrícola encolherá 1,7% este ano com a produção vegetal caindo 3%, o leite 6,4% e a cana de açúcar desacelerando de 19,2% para 3,4%.

No que se refere à economia, a inflação, apesar de estar reduzindo seu ritmo, ainda preocupa o que fez o BC manter a taxa Selic em 13,75%. O monitor do PIB da FGV apontou um crescimento de 0,9% em junho e de 0,6% em julho, mas, em julho, a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), indicador dos investimentos, caiu -0,8%. 

Continuamos a caminhar para o abismo.