Esmagadora derrota de Lula na reunião do Copom

Como de costume, o Conselho de Política Monetária (Copom), órgão do Banco Central (BC), publicou a ata da reunião em que decidiu, por unanimidade, encerrar a sucessão de reduções da taxa de referência Selic. Esta era a opinião do “Mercado”, esta entidade mítica que comanda toda a política econômica atualmente. A mídia excitada berra aos quatro cantos a grande novidade: Lula foi derrotado em sua pregação para desmoralizar o presidente do BC, o intocável, sua majestade Roberto Campos Junior. Teria mesmo sido uma derrota do presidente? Como votaram os 4 diretores por ele indicados? Como um “macaco velho”, tão matreiro e excelente negociador, meteu a “mão na cumbuca” de forma tão desastrada? São questões que merecem melhor reflexão.

Na verdade, a ata não trouxe grandes alterações, nem explicações sobre os resultados da reunião. E em nada reforçou os argumentos para demonstrar a justeza da decisão. O primeiro argumento apresentado foi o aumento das “incertezas econômicas externas. Não é necessária muita teoria para se concluir que uma taxa de juros elevada em nada afeta as “incertezas externas”, ou seja, para esta causa o remédio apontado é inútil. Outro argumento usado pelo Boletim Focus, publicação do BC,as “perspectivas desancoradas” do mercado também não sofrem qualquer alteração. O maior responsável pela “desancoragem das expectativas”, não é outro senão o próprio Campos Neto, que andou por aí discursando e difamando o futuro BC, que será constituído com nomes indicados pelo presidente Lula, incluindo o nome do novo presidente. Melhor seria se proibissem seu próprio presidente, Campos Neto, de falar as bobagens que influem nas “expectativas”.

Como os jornais noticiaram, o presidente do BC andou por aí em jantares e cerimônias, como a promovida pelo governador de São Paulo, onde fez questão de levantar suspeitas sobre o novo BC, no que tem sido ajudado pelo coro dos grandes jornais.

O outro argumento usado, sobre a elevação das projeções de inflação, igualmente não se justifica, pois o próprio BC calculou que o IPCA teve uma elevação de apenas 0,06%. O último argumento é o da “resiliência da atividade econômica”. Aí fica clara a verdadeira intenção do BC: dificultar o crescimento da economia. Quanto pior, melhor!

É a confirmação das denúncias feitas aqui nesta coluna: para o BC, a desgraça do país é o crescimento da economia, a queda do desemprego, que está no patamar mais baixo dos últimos 10 anos, a elevação dos salários, que provoca o aumento do consumo etc. Muita razão tem o presidente Lula ao denunciar o Roberto Campos Neto como agente do atraso. Esta solução adotada é o remédio amargo recomendado pela ideologia econômica,ultrapassada e reacionária, que é professada pela equipe que atualmente pontifica no BC. Além de anticientífica, é muito conveniente para quem quer prejudicar os planos de desenvolvimento do governo. É lamentável que os partidos e as forças sociais não façam esta denúncia. Até as próprias entidades empresariais, que finalmente estão adquirindo a consciência do prejuízo que estão sofrendo, com as elevadas taxas de juros, e começaram a se pronunciar, deveriam aumentar o coro dos protestos.

O papel nefasto da elevação dos juros para a atividade econômica é reconhecido por várias teorias. Não é preciso recorrer a Marx para se chegar a esta conclusão. O jornalista Pedro Cafardo, em artigo publicado no jornal Valor Econômico, cita alguns exemplos. No Brasil, depois de 2005, com juros reais médios de 6,5%, um rentista,aplicando seus recursos, dobraria seu capital em 11 anos. No mesmo período, nos EUA, com juros reais de 0,4%, o capital empregado só dobraria em 173 anos. Os altos rendimentos resultantes das elevadas taxas de juros contaminam toda a sociedade e contaminaram o próprio setor industrial, que começou a desviar parte de seu capital produtivo para “aplicações financeiras”, são os tais “ativos financeiros”.

Isso serviu de base para a aliança estre estes capitais e o setor financeiro-rentista, formando um poderoso bloco financeiro-rentista-industrial, que atualmente domina o congresso nacional e influencia todos os poderes da república. Cafardo baseia-se no livro “Financeirização, Crise, Estagnação e Desigualdade”, do cientista social da USP Bruno Mader. Bruno utiliza as teorias do economista polonês Michael Kalecki (1899-1970). Não é necessário, portanto, recorrer a Marx para se chegar a esta conclusão. Kalecki não é marxista, e desenvolve uma teoria com grande semelhança ao keynesianismo.

Temos, assim, mesmo sem recorrer a Marx, uma base teórica capaz de explicar a atual aliança de forças que dominam a política e as instituições no país. É contra este poderoso grupo que temos de lutar.

Para nossa felicidade, temos como timoneiro do barco o hábil negociador que é o presidente Lula. A partir destas suposições surge uma hipótese explicativa para o resultado do último Copom, que aparentou uma grande derrota do governo. O resultado é tão aberrante que nos leva a pensar em uma grande manobra do presidente para tentar reduzir o ruído atualmente existente e viabilizar a futura indicação do possível candidato para a presidência do BC, um dos atuais diretores, Gabriel Galípolo. Lula teria orientado, os diretores por ele indicados, para votar com os demais,atendendo as “exigências” do “mercado”. Parecendo ter sofrido uma grande derrota o timoneiro manobrou o barco para desviá-lo dos recifes e prosseguir navegando no rumo programado. A situação permanece muito tensa, mas a colisão imediata com os recifes foi evitada. O prosseguimento dependerá da correlação de forças que se está alterando. O frentão, que ganhou as eleições, como era previsível, está se rachando. O resultado dependerá da nova correlação de forças que se está formando e das lutas que se aproximam.