Rumor de botas

Bolsonaro militarizou o governo federal. São mais de 6000 militares ocupando cargos estratégicos na estrutura burocrática nacional. Além disso, o ministério da Defesa, comandada por um general, passou a ter um protagonismo político inusitado desde a sua criação, ocorrida no governo FHC.

Os militares brasileiros têm uma longa tradição de interferência no cenário político nacional. Mas nem sempre foi assim.

Durante o longo período imperial, entre 1822 e 1889, o exército brasileiro era uma instituição desprestigiada. Reduto de deserdados da sociedade, pagando baixos soldos e foco de constantes rebeliões. Suas funções eram guarnecer as fronteiras e perseguir escravos foragidos.

A tropa militar de confiança da elite econômica era a Guarda Nacional, fundada em 1831. Comandada pelos grandes proprietários rurais, a Guarda Nacional era empregada para reprimir as rebeliões provinciais e controlar as insurgências populares.

Tudo mudou com a Guerra da Tríplice Aliança (1865-70). No fim do conflito contra o Paraguai, o vitorioso exército brasileiro passou a ser cultivado como heroico por ter aniquilado as tropas de Solano López.

Os jovens oficiais que retornaram da guerra com o peito cheio de medalhas incorporaram a doutrina positivista e, sob o lema de Ordem e Progresso, passaram a conspirar no intuito de pôr um fim no governo monárquico.

A proclamação da República foi um golpe militar. O povo assistiu bestializado o desfile das tropas que derrubaram o regime imperial em 15 de outubro de 1989. Cabe ressaltar que Deodoro da Fonseca não era nem republicano nem positivista. A partir dessa ação política, os militares passaram a se envolver em vários golpes, quarteladas e sedições durante todo o século XX.

O tenentismo na década de 1920, o movimento político de 1930, a deposição de Getúlio Vargas em 1945, a tentativa de golpe contra Getúlio Vargas em 1954 e, finalmente, o golpe civil-militar de 1964 são os exemplos mais notórios da interferência dos militares na Política nacional.

Inspirando-se nessa tradição, Bolsonaro articula um golpe de Estado, caso não consiga vencer a eleição. Suas críticas infundadas contra o sistema eleitoral, seus arroubos autoritários e a escolha de um general da reserva para ser seu vice são indicadores gritantes de que o processo golpista está em marcha.

Bolsonaro sabe que, sem o apoio explícito dos militares, sua aventura golpista tende a fracassar, como aquela articulada por Donald Trump nos Estados Unidos, em janeiro de 2021.
Mais uma vez, o papel dos militares será decisivo para o futuro da frágil democracia brasileira.