O sonho do golpe
O presidente Jair Bolsonaro nunca escondeu seu desprezo pela democracia. Por diversas vezes, defendeu o regime ditatorial no Brasil e exaltou a tortura e seu símbolo maior: o coronel Ustra e seus sequazes. Na sua curta carreira castrense, o então tenente Bolsonaro foi punido por indisciplina e organização de motins.
Ele foi condenado por “insubordinação e deslealdade” pelos três coronéis que o julgaram. Por unanimidade, os oficiais afirmaram que Bolsonaro “revelou comportamento aético e incompatível com o pundonor militar e o decoro da classe, ao passar à imprensa informações sobre sua instituição”. Por seus tresloucados atos, foi chamado pelo general Geisel de “mau militar.”
A democracia tem dessas armadilhas. Permite que autoritários e antidemocráticos como Bolsonaro cheguem à presidência. O regime que ele achincalha dia e noite é o mesmo que permitiu, a ele e a seus três filhos, todos políticos profissionais, uma vida de prestígio e conforto. Mesmo assim, ele continua a vociferar contra os princípios democráticos.
Bolsonaro sonha com uma ditadura. Deseja transformar seu desejo em realidade. Para que isso ocorra, é preciso destruir as bases institucionais do regime democrático. Sua cruzada contra o voto eletrônico revela um plano explícito de solapar o resultado da eleição.
Com sua popularidade em queda, devido ao péssimo governo, Bolsonaro corre sério risco de perder a reeleição presidencial no próximo ano. Desesperado, aponta para uma permanência no poder mediante um golpe de Estado. Insuflando seus seguidores nas redes sociais contra a urna eletrônica, espera que haja uma comoção social em torno do seu nome. Suas ofensas contra ministros do TSE e STF têm o objetivo de manter sua tropa midiática inflamada, pronta para entrar em ação.
O Congresso Nacional não reage à marcha golpista bolsonarista. O Senado e a Câmara Federal, presididos por aliados de Bolsonaro, fingem que nada está ocorrendo. Assim como em 1964, muitos políticos profissionais apoiariam uma ditadura sem nenhum constrangimento. Enquanto isso, parte dos militares está saudosa dos tempos sombrios do regime militar.
Das instituições que dão sustentação à democracia, apenas o Judiciário tem reagido aos arroubos autoritários de Bolsonaro. Mesmo tardiamente, o endurecimento do discurso do Ministro Luiz Fux, presidente do STF, revela que os magistrados estão dispostos a lutar para manter a normalidade institucional.
É preciso mais para barrar o sonho de Bolsonaro. O Judiciário não pode permanecer isolado. Só uma grande mobilização nacional em defesa da democracia pode assegurar a continuidade da estabilidade política do país. Do contrário, 2022 corre sério risco de se transformar num pesadelo do povo brasileiro.